sábado, 8 de abril de 2023

Trinta.

Outubro de 1992. Quase 31 anos atrás.  Um pouco mais de doze anos atrás, escrevi aqui um texto, de um menino deslumbrado e preocupado com o mundo. Em outra idade emblemática, me volto para ruminar um pouco do que vivi, aprendi, desaprendi e conheci nessa vida.

A primeira coisa que aprendi é que a vida se importa muito pouco com os seus planos. Existem pessoas que traçam a vida inteira, e conseguem seguir passo a passo. Eu os invejo. Como um barco em tempestade, fui jogado para lugares que nunca imaginei ir sozinho. O garoto que tinha todas as certezas de onde estava saíndo e para onde estava indo não seria capaz de reconhecer este que o substitui. 

Me degladio para escrever esse texto. As memórias que um dia considerei primárias, já não são mais que borrões. Fundamentos e crenças já mudaram tanto que talvez eu devesse fundar o meu próprio secto religioso. Meu altruísmo e positividade pegaram um quê de cinismo e cretinice que se firma como uma pátina pela corrosão da vida real. E isso é tão ruim quanto é bom. Nenhum idealista vive muito tempo no mundo real.

Falando em mundo real, uma das conclusões mais frias que percebi é quão mundana é a minha vida. Provavelmente, se eu morresse hoje, haveria um ou dois dias de luto por um grupo seleto de amigos, e um pesar passageiro na vida de outras. A morte, assunto tabu em outros tempos, fica cada vez mais comum e menos chocante quanto mais o tempo passa. Não serei lembrado pela eternidade, como eu jurava que seria (e talvez, o que me motivou por muito tempo a crescer), e nem serei celebrado por alguém que não tenha me conhecido em vida. E tudo bem, assim foi com 99,9% de todos que aqui estavam. Deve haver algum dispositivo genético que te acalma ao longo do tempo sobre esta questão.

Mas, se for pra falar de algo mais mágico, a paternidade é a única coisa que genuínamente me dá forças pra brigar com esse status quo. Deus, em sua eterna sabedoria, me deu uma filha que me ensina todos os dias. É indissociável falar de mim e não falar do impacto que Camila tem em mim. O autismo dela me dá medo, confesso. Não consigo prever o futuro dela e o único medo que tenho de partir é deixá-la desamparada. É dificil até escrever este curto parágrafo sem ir às lágrimas. 

Interessante pensar nisso e na ciclicidade das coisas. Cada vez mais, me vejo mais parecido com os meus pais, e com o firme pensamento que nossas definições de inovações são patéticas. Homo Sapiens são animais que vivem seu ciclo de vida social quase que de forma idêntica desde sempre. Por mais que os séculos passem, filhos brigam com pais e acabam sendo seu reflexo, em aparência e costume. Me pego sempre imersos em pensamentos filosóficos de butiquim, que por mais geniais que me pareçam no momento, devem ter sido pensados infindas vezes por outros sábios anônimos ao longo das gerações, e mesmo assim, sou incapaz de colocar tudo isso no papel (ou no computador), pois me fogem quando tento racionalizá-los.

Felizmente, este blog ainda é feito para celebrar a minha abjetância. E talvez, em dez ou doze anos eu venha aqui dizer que tudo mudou, caso ainda o mundo esteja de pé. O fato é que hoje, sou mais eu e menos individual que já fui.